A Nova Crise Econômica Europeia
Motivos da Crise na Grécia
Após
um período de otimismo com as perspectivas de superação da crise
financeira e de retomada do crescimento na economia mundial no 2º
semestre do ano passado, o início de 2010 foi marcado por uma maior
inquietação, traduzida também em uma maior volatilidade nos preços de
ativos. Esta inquietação teve como foco o agravamento de desequilíbrios
fiscais em países europeus, expressos em níveis excessivamente elevados
tanto de déficit como de endividamento público em países como Espanha,
Irlanda, Itália, Portugal e, principalmente, Grécia. A grande maioria
dos países, na Europa e fora dela, mostrou deterioração de sua posição
fiscal em 2009. Isto tanto por conta dos efeitos da recessão sobre a
evolução da arrecadação como pelo esforço de muitos governos de combater
a desaceleração econômica com cortes de impostos e ampliação do gasto
público.
Esta
deterioração, contudo, teve implicações mais graves em países que,
mesmo antes da crise, exibiam uma posição fiscal estruturalmente frágil.
Esse era o caso da Grécia, que ao longo da última década exibiu
déficits primários persistentes e vultosos, levando, mesmo em um
contexto de juros baixos e crescimento econômico acelerado, à
estabilização da dívida pública como proporção do PIB em níveis muito
elevados, ao redor de 100%.
A Grécia é um país europeu localizado
no sul dos Bálcãs perto de países como Macedônia, Bulgária e Turquia,
em um ponto de extrema importância geoestratégica em função da
proximidade à Ásia e África. Possui um relevo acidentado (montanhoso) e
um clima mediterrâneo. A população de aproximadamente 11 milhões de
habitantes tem excelentes indicadores sociais, percebidos em um Índice
de Desenvolvimento Humano 0,942(2007). Normalmente quando se fala em
Grécia, lembra-se de Jogos Olímpicos, Filosofia, Ilhas belíssimas e
influente cultura. Porém, ultimamente, sites e jornais relacionam o país
grego a uma severa crise econômica que pode se alastrar pelo continente
europeu e pelo mundo.
Com a crise, o déficit público atingiu
nada menos que 12,7% do PIB em 2009, mais de quatro vezes o limite de 3%
estabelecido no Tratado de Maastricht***. Mesmo sob as hipóteses mais
otimistas, a dívida pública ultrapassará 120% do PIB em 2010. Outro
agravante igualmente importante é o fato de terem sido descobertas
recentemente evidências de que as contas públicas oficiais não refletiam
adequadamente a posição fiscal do país. O governo anterior mascarou os
números da situação fiscal e só recentemente veio à tona essa
porcentagem do déficit em relação ao PIB. A manipulação das contas, com o
objetivo de ocultar o déficit, gerou um enorme problema de
credibilidade, que dificulta, ainda mais, o encaminhamento de uma
solução para a crise agora.
Resumindo podemos dizer que os principais fatores que levaram a eclosão dessa crise são:
-
a crise financeira global, que teve o auge em 2008, afetou gravemente a
economia grega que não conseguiu se recuperar totalmente;
- uma
elevada dívida externa (algo em torno de 300 bilhões de Euros ou US$ 400
bilhões ou R$700 bilhões), associada à incapacidade de honrar os
compromissos de pagamento;
- internamente o país tem
elevadíssimos gastos com o bem estar social e salários (que dobraram nos
últimos anos!) e uma fraca receita, causada por uma enorme evasão de
impostos;
- diante deste quadro, os investidores internacionais
não têm confiança (palavra chave no mercado financeiro) para emprestar e
investir dinheiro na Grécia. Dessa forma, quando o fazem, cobram juros
mais altos para emprestar este dinheiro. Ou seja, uma dívida para pagar
outra dívida!
Tem-se, em suma, um caso clássico de crescimento
insustentável de dívida pública, que coloca a Grécia diante da
necessidade de promover um ajuste doloroso. O governo anunciou um
programa ambicioso, que prevê a redução do déficit de 12,7% para 2,8% do
PIB em 2012, com base em aumento de impostos, redução de gastos com
folha de pagamentos e reforma da previdência. Embora o anúncio siga na
direção correta, as dúvidas em relação à sua implementação são naturais,
dadas as dificuldades políticas inerentes a ajustes tão dramáticos. A
greve geral ocorrida no final de fevereiro em protesto ao ajuste, com
ampla adesão dos setores público e privado, é uma boa ilustração de tais
dificuldades. Além disto, o déficit de credibilidade também torna mais
difícil a resolução do déficit fiscal. Mesmo que o país tenha intenção e
capacidade de implementar o ajuste prometido, seus resultados demorarão
a se tornar palpáveis, e o ceticismo do mercado pode fazer com que os
gastos com juros da dívida se elevem, anulando uma parte do eventual
esforço de melhora do resultado primário.
Os
países do Euro teriam muito interesse em evitar uma crise de dívida na
Grécia. A razão óbvia é que uma crise deste tipo provavelmente geraria
algum grau de contágio nos demais países da região, principalmente
naqueles já mencionados, que também apresentam fragilidade fiscal, mesmo
que em intensidade bastante inferior à da Grécia. Tal contágio se daria
pelo elevado grau de integração, no que tange aos fluxos de comércio e
de capital, que une os países da região. Neste sentido, é possível
pensar em algum tipo de programa em que o custo incorrido pelos demais
países da região é inferior às possíveis externalidades que eles
sofreriam com o agravamento da crise grega. Ainda assim, é preciso
atentar também para as enormes dificuldades envolvidas em um acordo
desta natureza. A questão fundamental é que qualquer tipo de ajuda
somente teria eficácia se vier acompanhada de condições suficientemente
críveis para assegurar que o ajuste fiscal seja, de fato, implementado.
Além disto, certamente seria de interesse dos demais países europeus
evitar a geração de incentivos perversos para a condução da política
fiscal nos países da região. Em outras palavras, seria de se esperar que
houvesse um esforço para demonstrar que a irresponsabilidade fiscal é
um mau negócio. Caso contrário, a ajuda à Grécia poderia gerar
incentivos para o surgimento de novas e mais amplas crises no futuro.
A CRISE NO BLOCO EUROPEU
Há
temores de que um agravamento da crise leve a um eventual calote da
dívida grega e que países como Portugal, Itália, Espanha e Irlanda
acabem entrando pelo mesmo caminho.
Investidores observam com
preocupação os cenários previstos por especialistas, como o de vários
países sendo forçados a cortar drasticamente os seus gastos públicos e
elevando taxas de juros para poder pagar suas dívidas, ou o de países
deixando a chamada zona do euro e provocando uma dissolução da União
Europeia.
Outro temor é com as perdas dos bancos que emprestaram
dinheiro a esses países, perdas que podem levar a uma nova crise de
crédito.
Esses temores se intensificaram no dia 23 de abril,
quando a Grécia pediu formalmente ajuda financeira à União Europeia e ao
Fundo Monetário Internacional para tirar o país de sua crise de débito.
O
país está pedindo até 45 bilhões de euros em empréstimos de emergência
aos países da zona do euro e ao FMI neste ano, mas existe a preocupação
de o acordo não ser fechado e se vai ser necessária mais ajuda.
No
início de maio, os líderes dos países da zona do euro tinham concordado
com um pacote de emergência de 30 bilhões de euros para a Grécia. Mas
até que ponto essa ajuda pode resolver a crise?
Sim, há um risco,
desde a extinção do euro, que considero muito pequeno e o mais provável
a depreciação do euro perante outras moedas. Nessa segunda hipótese há
uma questão vantajosa para o bloco europeu como um todo no sentido da
exportação. A moeda deles estando mais depreciada irá favorecê-los como
players internacionais mais fortes para a colocação de seus produtos no
mercado. Isso, no meu entender, vai na mesma direção do que está
acontecendo também com EUA e Japão, que são países que deverão continuar
um processo de depreciação de suas moedas para fortalecer as suas
posições exportadoras. Eles perderam capacidade competitiva no mercado
internacional, fundamentalmente, pelo diferencial salarial que praticam
em relação aos países emergentes, especialmente do leste da Ásia. Assim,
a maneira que eles terão para poder competir em condições de maior
vigor no comércio internacional será por meio da depreciação de suas
moedas, caminho que eu vejo quase que inexorável e que será acelerado em
decorrência dos trilhões de dólares emitidos para salvar seus sistemas
financeiros.
No todo, nossa visão é de que o encaminhamento de
uma solução para os problemas gregos envolverá negociações difíceis, que
devem se arrastar por algum tempo. Seja qual for o desfecho,
acreditamos que esta crise terá impactos negativos sobre a recuperação
da Europa, embora sua intensidade ainda seja muito incerta.
É
importante enfatizar que as dificuldades ora enfrentadas pela Europa não
invalidam um cenário ainda construtivo para a economia mundial. Por
enquanto, o que se pode dizer é que, embora o cenário mais provável para
a economia mundial ainda seja moderadamente positivo, temos um grau
maior de incerteza. Sobretudo, em crises deste tipo há uma interação
maior entre questões econômicas e políticas. Do ponto de vista dos
mercados, tais incertezas normalmente se traduzem em níveis mais altos
de volatilidade.
Ressalto algumas lições importantes que a crise
grega nos traz. Não há nada de errado em utilizar a política fiscal para
tentar reduzir a amplitude do ciclo econômico, mas é preciso considerar
que o espaço para a implementação de estratégias deste tipo depende
crucialmente das condições iniciais. Países com baixos níveis de
endividamento público e com resultados primários estruturalmente
saudáveis certamente terão maior capacidade de, em períodos recessivos,
utilizar a política fiscal para ativamente estimular a economia. Além
disto, políticas fiscais anticíclicas somente podem ter consistência se
valerem para todas as fases do ciclo.
Por último, a crise grega
nos relembra da importância da transparência fiscal: expurgos de
determinados tipos de gastos e mudanças na definição da meta fiscal
reduzem a capacidade dos analistas de, a partir dos dados de contas
públicas, avaliarem as condições de solvência do Governo. Este tipo de
opacidade pode ter impactos tão danosos quanto a piora da posição fiscal
no longo prazo.
ESPANHA
Apesar
de ter uma economia mais forte do que as da Grécia e Portugal, a
Espanha tem um problema de endividamento privado, principalmente de
mutuários de empréstimos habitacionais que se viram em apuros quando a
bolha imobiliária do país estourou. Os grandes bancos espanhóis são
sólidos, mas há problemas nas cajas de ahorro, instituições de pequeno
porte com foco em poupança e hipotecas e que tiveram um forte aumento da
inadimplência. A recessão no país é profunda: a taxa de desemprego
chegou a 20%. Sua dívida pública, em proporção do PIB, é metade da grega
(53,2%). Porém, como se trata de uma economia muito maior, em volume, o
endividamento espanhol (um trilhão de euros) faria um estrago enorme em
caso de insolvência e é isso que preocupa os investidores.
PORTUGAL
O
país sofre com baixo crescimento há mais tempo e, além de uma
complicada situação fiscal - a dívida pública em 2009 era de 76,8% do
PIB -, tem uma elevada dívida privada externa. Em fevereiro de 2010, a
taxa de desemprego atingiu 10,3%.
Resumindo os itens abordados:
Por que a Grécia está nessa situação?
A
Grécia gastou bem mais do que podia na última década, pedindo
empréstimos pesados e deixando sua economia refém da crescente dívida.
Nesse período, os gastos públicos foram às alturas e os salários do funcionalismo praticamente dobraram.
Enquanto
os cofres públicos eram esvaziados pelos gastos a receita era atingida
pela alta evasão de impostos, prática generalizada no país.
A Grécia estava completamente despreparada quando chegou à crise global de crédito.
O
déficit no orçamento, ou seja, a diferença entre o que o país gasta e o
que arrecada, foi, em 2009, de 13,6% do PIB, um dos índices mais altos
da Europa e quatro vezes acima do tamanho permitido pelas regras da
chamada zona do euro.
Sua dívida está em torno de 300 bilhões de euros (o equivalente a US$ 400 bilhões ou R$ 700 bilhões).
O
montante da dívida deixou investidores relutantes em emprestar mais
dinheiro ao país. Hoje, eles exigem juros bem mais altos para novos
empréstimos.
Essa situação é particularmente preocupante, porque a
Grécia depende de novos empréstimos para refinanciar mais de 50 bilhões
de euros em dívidas neste ano.
Por que a situação causa tanta preocupação fora da Grécia?
Todo
mundo na zona do euro – e qualquer um que negocie com a zona do euro – é
afetado por causa do impacto da crise grega sobre a moeda comum
europeia.
Teme-se que os problemas da Grécia nos mercados
financeiros internacionais provoquem um efeito dominó, derrubando outros
membros da zona do euro cujas economias estão enfraquecidas, como
Portugal, Irlanda, Itália e Espanha. Todos eles enfrentam desafios para
reequilibrar suas contas.
Em março passado, a agência de classificação de risco Fitch rebaixou a classificação de Portugal de AA para AA-.
Questões sobre o alto nível das dívidas na Europa foram levantadas em vários países.
O que a Grécia está fazendo quanto a isso?
A Grécia apresentou planos para cortar seu déficit para 8,7% em 2010, e para menos de 3% até 2012.
Para alcançar isso, o Parlamento grego aprovou um pacote de medidas de austeridade para economizar 4,8 bilhões de euros.
O governo quer congelar os salários do setor público e aumentar os impostos, e ainda anunciou o aumento do preço da gasolina.
O
governo ainda pretende aumentar a idade para a aposentadoria em uma
tentativa de economizar dinheiro no sistema de pensões, já
sobrecarregado.
Como essas medidas foram recebidas na Grécia?
De
maneira nem um pouco positiva. Houve uma série de protestos no país,
alguns violentos. Várias greves atingiram escolas e hospitais e
praticamente paralisaram o transporte público.
Muitos servidores
públicos acreditam que a crise foi criada por forças externas, como
especuladores internacionais e banqueiros da Europa central.
Os dois maiores sindicatos do país classificaram as medidas de austeridade como “antipopulares” e “bárbaras”.
O que acontece agora?
A Grécia precisa de 10 bilhões de euros até o mês que vem para cumprir suas obrigações financeiras.
Com
o pacote da UE e FMI, o país deve conseguir levantar essa soma, mas as
condições exatas deste empréstimo ainda não foram acordadas.
Se os detalhes foram definidos rapidamente e sem grandes problemas, o país conseguirá pagar sua dívida mais facilmente.
Em
teoria, isso deveria proporcionar uma queda nos custos de empréstimo do
governo e o euro deveria voltar a se fortalecer, depois de ter sofrido
queda nas últimas semanas por causa do medo de a Grécia não conseguir
pagar suas dívidas.
A Grécia poderia simplesmente abandonar o euro?
Operadores
de câmbio já demonstraram medo de que alguns países com grandes
déficits no orçamento – como a Grécia, Espanha e Portugal – possam se
sentir tentados a abandonar o euro.
Ao deixar a moeda comum, o país poderia permitir a desvalorização de sua moeda e, assim, melhorar sua competitividade.
Mas
isso também causaria grandes rupturas nos mercados financeiros,
provocando o medo entre os investidores de que outros países adotassem a
mesma estratégia, potencialmente levando ao fim da união monetária.
Mas
a União Européia já demonstrou que quer manter a zona do euro unida e
descartou a ideia de que países iriam abandonar a moeda.
Como a situação da Grécia se compara a de outros países?
A
Grécia não é o único país da zona do euro a violar a regra que afirma
que o déficit orçamentário não deve ultrapassar 3% do PIB do país.
Na
Grã-Bretanha, que não está na zona do euro, esse déficit chega a 13% do
PIB. Na Espanha ele chega a 11,2%, na Irlanda a 14,3% e na Itália a
5,3%.
BRASIL
A
aversão de investidores estrangeiros ao risco (compra de ativos de
emergentes, por exemplo) pode dificultar a emissão de papéis (captação
de recursos) de empresas brasileiras, tanto internamente como no
exterior. Pode ainda acelerar a saída de dólares do país, o que tende a
desvalorizar o real e, caso o movimento seja acentuado, encarecer
produtos estrangeiros no país e pressionar os preços.
Assim, esse parece o impacto mais provável dessa crise no Brasil, mas sem a queda abrupta de atividade sofrida há um ano e meio.
***
O
Tratado de Maastricht, também conhecido como Tratado da União Europeia
(TUE) foi assinado a 7 de Fevereiro de 1992 na cidade holandesa de
Maastricht.O Tratado de Maastrich foi um marco significativo no processo
de unificação europeia, fixando que à integração econômica até então
existente entre diversos países europeus se somaria uma unificação
política. O seu resultado mais evidente foi a substituição da
denominação Comunidade Europeia pelo termo atual União Europeia.
O
Tratado de Maastricht criou metas de livre movimento de produtos,
pessoas, serviços e capital. Visava à estabilidade política do
continente. Mas, a imigração continuou atuando com exigência de
passaportes.
A estrutura do tratado da União é composta por 3 pilares:
• 1º pilar:
Trata-se
de assuntos relacionados com a agricultura, ambiente, saúde, educação,
energia, investigação e desenvolvimento. A legislação neste pilar é
adotada conjuntamente pelo Parlamento Europeu e pelo Conselho. O
Conselho delibera por maioria simples, por maioria qualificada ou por
unanimidade. Em assuntos tais como fiscalidade, a indústria, fundos
regionais, investigação exigem deliberação por unanimidade.
• 2ºpilar:
Trata de assuntos de política externa e segurança comum.
• 3ºpilar:
Trata
de assuntos de cooperação policial e judiciária em matéria penal. No 2º
e 3º pilares compete ao Conselho deliberar por unanimidade em matérias
de maior relevância. Na maior parte dos assuntos é suficiente a maioria
qualificada e em matérias de menor relevância é apenas a maioria
simples.
Fonte: Rui Alves
Perguntas e Respostas
Maio de 2010
Crise na Europa
A Europa, sempre lembrada como uma região de altíssimo desenvolvimento econômico e bem-estar social, agora tem sua imagem associada a turbulências de mercado. Entenda como o descontrole das contas públicas e as particularidades políticas do continente conduziram a zona do euro a uma crise financeira que levará anos para ser totalmente superada.
MOSTRAR TODAS
IMPRIMA
1. Por que a Europa passa por uma crise?
A formação de uma crise financeira na zona do euro deu-se, fundamentalmente, por problemas fiscais. Alguns países, como a Grécia, gastaram mais dinheiro do conseguiram arrecadar por meio de impostos nos últimos anos. Para se financiar, passaram a acumular dívidas. Assim, a relação do endividamento sobre PIB de muitas nações do continente ultrapassou significativamente o limite de 60% estabelecido no Tratado de Maastricht, de 1992, que criou a zona do euro. No caso da economia grega, exemplo mais grave de descontrole das contas públicas, a razão dívida/PIB é mais que o dobro deste limite. A desconfiança de que os governos da região teriam dificuldade para honrar suas dívidas fez com que os investidores passassem a temer possuir ações, bem como títulos públicos e privados europeus.
2. Quando os investidores passaram a desconfiar da Europa?
Os primeiros temores remontam 2007 quando existiam suspeitas de que o mercado imobiliário dos Estados Unidos vivia uma bolha. Temia-se que bancos americanos e também europeus possuíam ativos altamente arriscados, lastreados em hipotecas de baixa qualidade. A crise de 2008 confirmou as suspeitas e levou os governos a injetarem trilhões de dólares nas economias dos países mais afetados. No caso da Europa, a iniciativa agravou os déficits nacionais, já muito elevados. Em fevereiro de 2010, uma reportagem do The New York Times revelou que a Grécia teria fechado acordos com o banco Goldman Sachs com o objetivo de esconder parte de sua dívida pública. A notícia levou a Comissão Européia a investigar o assunto e desencadeou uma onda de desconfiança nos mercados. O clima de pessimismo foi agravado em abril pelo rebaixamento, por parte das agências de classificação de risco, das notas dos títulos soberanos de Grécia, Espanha e Portugal.
3. Quais países se encontram em situação de risco na Europa e por quê?
Portugal, Irlanda, Itália, Grécia e Espanha - que formam o chamado grupo dos PIIGS - são os que se encontram em posição mais delicada dentro da zona do euro, pois foram os que atuaram de forma mais indisciplinada nos gastos públicos e se endividaram excessivamente. Além de possuírem elevada relação dívida/PIB, estes países possuem pesados déficits orçamentários ante o tamanho de suas economias. Como não possuem sobras de recursos (superávit), entraram no radar da desconfiança dos investidores. Para este ano, as projeções da Economist Intelligence Unit apontam déficits/PIB de 8,5% para Portugal, 19,4% para Irlanda, 5,3% para Itália, 9,4% para Grécia e 11,5% para Espanha.
4.Por que o bloco europeu não consegue regular sua política fiscal como os Estados Unidos, por exemplo?
Apesar de ter um órgão responsável pela política monetária, o Banco Central Europeu (BCE), que estabelece metas de inflação e controla a emissão de euros, a União Européia não dispõe de uma instituição única que monitora e regula os gastos públicos dos 16 países-membro. Dessa maneira, demora a descobrir os desleixos governamentais e, quando isso acontece, inexistem mecanismos austeros de punição. Em 1999, os países da região encerraram um ciclo de discussões chamado Pacto de Estabilidade e Crescimento. Em resumo, as nações comprometeram-se com a questão do equilíbrio fiscal. Àquelas altamente endividadas ficou a imposição de apresentar ‘planos de convergência’ para patamares de dívida mais aceitáveis. As sanções seriam recolhimentos compulsórios e multas. Contudo, sua aplicação não seria automática, ficando na dependência de uma avaliação pelo Conselho Europeu. A política mostrou-se insuficiente para controlar os gastos públicos dos PIIGS.
5.A crise financeira pode afetar a economia real da Europa?
A desconfiança em relação à Europa pode disseminar pânico no mercado e fazer com que bancos fiquem excessivamente cautelosos ou até parem de liberar crédito para empresas e clientes. Os investidores, ao venderem ações e títulos europeus, provocam fuga de capitais da região. Sem poder provocar uma maxidesvalorização do euro, haja vista que isso prejudicaria aqueles países que têm as contas controladas, a opção é impor sacrifícios à população, como corte de salários e congelamento de benefícios sociais. Tudo isso implica menos dinheiro para fazer a economia girar - justo num momento em que a zona do euro precisa crescer e aumentar sua arrecadação para diminuir o endividamento. O risco é a criação de um círculo vicioso, em que uma estagnação ou, até mesmo, uma recessão, prejudique os esforços de ajuste fiscal - o que levaria a medidas de austeridade ainda mais severas, mais recessão, e assim por diante. Num segundo momento, a Europa, como um dos maiores mercados consumidores do mundo, diminuiria o ritmo de importação de bens e serviços e prejudicaria a dinâmica econômica global.
6. Por que o euro se desvaloriza?
A possibilidade de que governos e empresas da região tornem-se insolventes faz com boa parte dos investidores simplesmente não queira ficar exposta ao risco de ações e títulos europeus. Na primeira metade do ano, o que se viu foi um movimento de venda destes papéis e fuga para ativos considerados seguros, como os títulos do Tesouro norte-americano. Tal movimento, de procura por dólares e abandono do euro, fez com que a cotação da moeda européia atingisse valores historicamente baixos. As moedas também refletem o vigor das economias. Assim, argumentam os analistas, a tendência de longo prazo é de fortalecimento do dólar e das moedas dos países emergentes (real inclusive), enquanto a Europa não conseguir resolver seus problemas fiscais e criar condições para um crescimento econômico mais acentuado.
7. O que foi feito para evitar a derrocada do euro?
Dois pacotes de socorro foram aprovados com o intuito de ganhar tempo para a tarefa de reorganizar as contas dos países mais endividados e restabelecer a confiança dos investidores na região. O primeiro voltava-se exclusivamente à Grécia e somou cerca de 110 bilhões de euros. O montante, levantado pelo Fundo Monetário Internacional (€ 30 bilhões) e pelos governos dos países da zona do euro (€ 80 bilhões), deve ser liberado de forma progressiva num prazo de três anos. O segundo foi a constituição de um fundo emergencial de 750 bilhões de euros para situações de crise na União Européia. Qualquer país da região estaria apto a recorrer a ele. A maior parte, € 500 bilhões, virá de países europeus e o restante, € 250 bilhões, do FMI.
Fonte: Veja
Perguntas e Respostas
Maio de 2010
Crise na Europa
A Europa, sempre lembrada como uma região de altíssimo desenvolvimento econômico e bem-estar social, agora tem sua imagem associada a turbulências de mercado. Entenda como o descontrole das contas públicas e as particularidades políticas do continente conduziram a zona do euro a uma crise financeira que levará anos para ser totalmente superada.
MOSTRAR TODAS
IMPRIMA
1. Por que a Europa passa por uma crise?
A formação de uma crise financeira na zona do euro deu-se, fundamentalmente, por problemas fiscais. Alguns países, como a Grécia, gastaram mais dinheiro do conseguiram arrecadar por meio de impostos nos últimos anos. Para se financiar, passaram a acumular dívidas. Assim, a relação do endividamento sobre PIB de muitas nações do continente ultrapassou significativamente o limite de 60% estabelecido no Tratado de Maastricht, de 1992, que criou a zona do euro. No caso da economia grega, exemplo mais grave de descontrole das contas públicas, a razão dívida/PIB é mais que o dobro deste limite. A desconfiança de que os governos da região teriam dificuldade para honrar suas dívidas fez com que os investidores passassem a temer possuir ações, bem como títulos públicos e privados europeus.
2. Quando os investidores passaram a desconfiar da Europa?
Os primeiros temores remontam 2007 quando existiam suspeitas de que o mercado imobiliário dos Estados Unidos vivia uma bolha. Temia-se que bancos americanos e também europeus possuíam ativos altamente arriscados, lastreados em hipotecas de baixa qualidade. A crise de 2008 confirmou as suspeitas e levou os governos a injetarem trilhões de dólares nas economias dos países mais afetados. No caso da Europa, a iniciativa agravou os déficits nacionais, já muito elevados. Em fevereiro de 2010, uma reportagem do The New York Times revelou que a Grécia teria fechado acordos com o banco Goldman Sachs com o objetivo de esconder parte de sua dívida pública. A notícia levou a Comissão Européia a investigar o assunto e desencadeou uma onda de desconfiança nos mercados. O clima de pessimismo foi agravado em abril pelo rebaixamento, por parte das agências de classificação de risco, das notas dos títulos soberanos de Grécia, Espanha e Portugal.
3. Quais países se encontram em situação de risco na Europa e por quê?
Portugal, Irlanda, Itália, Grécia e Espanha - que formam o chamado grupo dos PIIGS - são os que se encontram em posição mais delicada dentro da zona do euro, pois foram os que atuaram de forma mais indisciplinada nos gastos públicos e se endividaram excessivamente. Além de possuírem elevada relação dívida/PIB, estes países possuem pesados déficits orçamentários ante o tamanho de suas economias. Como não possuem sobras de recursos (superávit), entraram no radar da desconfiança dos investidores. Para este ano, as projeções da Economist Intelligence Unit apontam déficits/PIB de 8,5% para Portugal, 19,4% para Irlanda, 5,3% para Itália, 9,4% para Grécia e 11,5% para Espanha.
4.Por que o bloco europeu não consegue regular sua política fiscal como os Estados Unidos, por exemplo?
Apesar de ter um órgão responsável pela política monetária, o Banco Central Europeu (BCE), que estabelece metas de inflação e controla a emissão de euros, a União Européia não dispõe de uma instituição única que monitora e regula os gastos públicos dos 16 países-membro. Dessa maneira, demora a descobrir os desleixos governamentais e, quando isso acontece, inexistem mecanismos austeros de punição. Em 1999, os países da região encerraram um ciclo de discussões chamado Pacto de Estabilidade e Crescimento. Em resumo, as nações comprometeram-se com a questão do equilíbrio fiscal. Àquelas altamente endividadas ficou a imposição de apresentar ‘planos de convergência’ para patamares de dívida mais aceitáveis. As sanções seriam recolhimentos compulsórios e multas. Contudo, sua aplicação não seria automática, ficando na dependência de uma avaliação pelo Conselho Europeu. A política mostrou-se insuficiente para controlar os gastos públicos dos PIIGS.
5.A crise financeira pode afetar a economia real da Europa?
A desconfiança em relação à Europa pode disseminar pânico no mercado e fazer com que bancos fiquem excessivamente cautelosos ou até parem de liberar crédito para empresas e clientes. Os investidores, ao venderem ações e títulos europeus, provocam fuga de capitais da região. Sem poder provocar uma maxidesvalorização do euro, haja vista que isso prejudicaria aqueles países que têm as contas controladas, a opção é impor sacrifícios à população, como corte de salários e congelamento de benefícios sociais. Tudo isso implica menos dinheiro para fazer a economia girar - justo num momento em que a zona do euro precisa crescer e aumentar sua arrecadação para diminuir o endividamento. O risco é a criação de um círculo vicioso, em que uma estagnação ou, até mesmo, uma recessão, prejudique os esforços de ajuste fiscal - o que levaria a medidas de austeridade ainda mais severas, mais recessão, e assim por diante. Num segundo momento, a Europa, como um dos maiores mercados consumidores do mundo, diminuiria o ritmo de importação de bens e serviços e prejudicaria a dinâmica econômica global.
6. Por que o euro se desvaloriza?
A possibilidade de que governos e empresas da região tornem-se insolventes faz com boa parte dos investidores simplesmente não queira ficar exposta ao risco de ações e títulos europeus. Na primeira metade do ano, o que se viu foi um movimento de venda destes papéis e fuga para ativos considerados seguros, como os títulos do Tesouro norte-americano. Tal movimento, de procura por dólares e abandono do euro, fez com que a cotação da moeda européia atingisse valores historicamente baixos. As moedas também refletem o vigor das economias. Assim, argumentam os analistas, a tendência de longo prazo é de fortalecimento do dólar e das moedas dos países emergentes (real inclusive), enquanto a Europa não conseguir resolver seus problemas fiscais e criar condições para um crescimento econômico mais acentuado.
7. O que foi feito para evitar a derrocada do euro?
Dois pacotes de socorro foram aprovados com o intuito de ganhar tempo para a tarefa de reorganizar as contas dos países mais endividados e restabelecer a confiança dos investidores na região. O primeiro voltava-se exclusivamente à Grécia e somou cerca de 110 bilhões de euros. O montante, levantado pelo Fundo Monetário Internacional (€ 30 bilhões) e pelos governos dos países da zona do euro (€ 80 bilhões), deve ser liberado de forma progressiva num prazo de três anos. O segundo foi a constituição de um fundo emergencial de 750 bilhões de euros para situações de crise na União Européia. Qualquer país da região estaria apto a recorrer a ele. A maior parte, € 500 bilhões, virá de países europeus e o restante, € 250 bilhões, do FMI.
Fonte: Veja
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